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Presidencialismo às avessas

  • 30 de Agosto de 2015

A invenção é de Sarney e consiste em ter uma constituição parlamentarista e um presidente eleito por outra via que só pode governar se tiver uma base parlamentar ampla e altruísta. Como isto não acontece nem na Inglaterra, para ele governar tem que cooptar a oposição e por equidade a situação em um mafuá semelhante à uma feira. Cooptar tem um preço elevado e pode ser feito por escambo de dotações, obras e cargos ou mediante vaselina para aprovar medidas provisórias. Quando não há mais o que trocar e a vaselina mingou a feira acaba e a cidade fecha as portas. É o que estamos vivendo

Em consequência desta regra todos os presidentes, a partir de 1988, passaram a ser presas do parlamento. Cid Gomes confirmou que o nosso congresso tem 300 a 400 achacadores e ninguém protestou. Há muito a Petrobras é a principal fornecedora deste lubrificante de governabilidade e não apenas nas eleições. Mas agora o parlamento saiu do armário e é quem governa, a ponto do presidente da Câmara baixar uma “moção de censura” à presidente e ameaça-la de demitir e convocar novas eleições, como um rei numa monarquia. A presidente entregou os anéis para não perder os dedos e agora roda o pais pedindo um “voto de confiança”, para seu governo não cair. É o presidencialismo às avessas.

A crise é muito maior do que se diz. Os políticos fingem não saber que a crise é institucional e tudo mais é consequência dela. Nenhuma coligação de pseudo-partidos conseguirá tirar o pais do atoleiro com o regime vigente. Enquanto isso, uma classe média despolitizada e assustada não entende que o buraco está mais embaixo e bate panela. Como prudência e agua benta não fazem mal a ninguém, Angela Merkel visita Dilma temendo o alastramento da crise que já chegou ao Peru. Qual é a saída? Alguns apontam um parlamentarismo autentico, e não aquele do II Reinado ou casuístico, como o do tempo de Jango. Os presidencialistas dizem que não podemos ter parlamentarismo porque não temos partidos. Aí entramos na aporia do ovo e da galinha. Há ainda os que sonham com um presidencialismo tipo norte americano, em que o presidente é eleito pelos delegados do partido que fizer a maior bancada e esta tem que apoiar o presidente se quiser manter o mando de campo.

Alguns cientistas políticos, com os quais simpatizo (A Tarde, 23/11/14), defendem o semi-presidencialismo, regime adotado por países que passaram por graves crises institucionais, como a França em 1959, Portugal em 1976 e a maioria das nações que saíram da União Soviética, onde o presidente dirige a política externa e numa crise pode destituir o primeiro ministro que comanda o executivo interno. Se a crise for muito forte o presidente pode até convocar novas eleições. Assim o regime se apoia em um tripé formado pelo congresso que é o legislador, pelo primeiro-ministro que é o executor, e pela presidência que, com o respaldo popular, exerce a função política e moderadora.

A nossa crise só se resolve com uma nova constituinte, pois nossos congressistas não vão abrir mão do cheque em branco que têm na carteira. Precisamos nos reinventar, pois mais importante que implodir a presidência às avessas é saber o que vamos construir depois.

SSA: 30/08/15


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