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A Internete e as nossas cidades

  • 06 de Dezembro de 2015

O colega Gilberto Corso, da UFBA, me pediu um pequeno texto para servir de base a uma oficina sobre “A internet e as pessoas em Salvador”. Gosto desses desafios e passei a matutar. A internet vem transformando a vida de todos nós e vai transformar ainda mais. Nos restaurantes casais não conversam, navegam na internet. Nas ruas, muitas pessoas com fomes nos ouvidos caminham desatentas enquanto ouvem músicas. Alguns acham que ela segrega. Para mim ela não isola, senão que manda recados por debaixo do pano. Foi a internet que uniu milhares de cidadãos no Cairo e em outras capitais do Oriente Médio para derrubarem ditadores. O estouro do admirável gado novo, em junho de 2013, se alastrou por todo o país com os mugidos na internet. Só agora as autoridades estão despertando para o seu aviso.

Uma das características mais distintivas da internet é a desterritorialização. Call centers de empresas e bancos americanos e europeus estão na Índia e na China a milhares de quilômetros de suas sedes. Há um filme argentino chamado “Medianeras”, nome daquelas paredes que ligam e separam duas edificações. Nele um rapaz e uma moça solitários começam um namoro pela internet e a certa altura resolvem se conhecer imaginado que moravam a milhares de quilômetros de distância e descobrem que eram vizinhos da mesma quadra, um acaso. Em 1992, fui a Sevilha ver a Exposição Universal do Descobrimento da América. Ali conheci um colega peruano que lutava, há anos, para ter reconhecido seu diploma. Cansado, resolveu trabalhar na Alemanha sem sair de casa. Desenvolvia projetos para grandes escritórios e ia uma vez por ano a Berlim para ajustar suas contas.

Podemos ver filmes e concertos e fazer compras sem sair de casa. Com isso podemos diminuir o trafego nas cidades e torna-las mais humanas. Estudantes podem fazer cursos em universidades distantes indo apenas algumas vezes aos seus campi. Pela internet é possível vigiar a casa desde o escritório, em outra cidade. Mas a internet serve também ao mal. Extorsões e crimes são comandados de prisões, hackers transferem milhões de dólares de clientes de bancos para suas contas e ainda são disputados, a peso de ouro, pelas empresas de segurança bancaria. O terrorismo articula suas ações através de inocentes jogos infantis, para ninguém desconfiar

O polémico aplicativo “uber”, que transforma carros de passeio em táxis é a última ferramenta da internet de serviços urbanos. Mas não são apenas os taxistas que estão preocupados, senão as gravadoras, as locadoras de carros e apartamentos, os hotéis e empresas prestadoras de serviço. E o que será dos shoppings centers com seus altos custos de energia, segurança e promoções diante dos Submarinos da vida que vendem para todo o pais, sem ar condicionado nem decoração e dispensam estoques, repassando os pedidos para os fabricantes? Os grandes grupos internacionais sabem que os shoppings estão em crise e só se interessam por redes de supermercados, que trabalham com produtos perecíveis, que não podem ser enviados pelo correio. Como seria interessante discutir esta e outras questões sem as peias das pautas e dos lobbies, pensando no futuro de todos.

SSA: A Tarde, 06/12/15


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