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A queda da inteligência média mundial

  • 30 de Maio de 2021

Até o final dos anos 90 a inteligência média mundial, medida pelo método Flynn, vinha crescendo a três pontos percentuais por década. Este crescimento estava associado à melhoria das condições de nutrição, saúde e educação. Mas nas últimas duas décadas ela vem caindo, especialmente nos países desenvolvidos, no que se chamou de “efeito Flynn reverso”.

Esse fato coincide com o avanço da tecnologia digital e o uso cada vez menor da escrita. O primeiro passo para isto foi a introdução de ícones nos sistemas operacionais dos computadores. A maioria dos aplicativos têm limitações de escrita. O Tweeter só aceita 280 toques, o que não permite o desenvolvimento de um raciocínio pleno. O Instagram transfere imagens com apenas legendas, no WhatsApp se criou o “digitês”, com abreviaturas sincopadas e é cada vez mais frequente a substituição da escrita por voz. Os e-mails já trazem as respostas: “obrigado”, “confirmado”, “não concordo”, bastando clicar. Em outras palavras, estamos criando uma comunicação ágrafa, sem ou com escrita restrita.

 A escrita permitiu registrar materialmente a memória e criar a História. Conservam-se tabuletas cerâmicas com escrita cuneiforme da Mesopotâmia de 3.200 aC e Gutenberg universalizou a escrita, no século XV. A memória digital é volátil e os suportes, aplicativos e drives caducam e as nuvens desabam, se não forem pagas. A correspondência civil tende a se volatizar e só restar a História Oficial, dos documentos publicados.

A linguagem na internet está eliminando as flexões verbais do passado e do futuro e achatando tudo ao presente. Sutilezas expressas pelo condicional, o imperfeito e o subjuntivo estão desaparecendo e toda subjetividade morrendo. Para Lacan o inconsciente tem a estrutura da linguagem. Para ele, a criança só se torna um sujeito quando aprende a língua.

 

O Prof. Mark Bauerlein autor do livro “A geração burra: como a era digital torna os jovens mais estúpidos e ameaça nosso futuro”, inédito no português, diz que há indícios de que o uso de smartphones e tablets na infância já esteja causando efeitos negativos. Na Inglaterra, 28% das crianças da pré-escola (4 e 5 anos) não sabem utilizar frases completas..

Haverá sempre uma elite intelectual, cada vez mais concentrada, e uma massa desinformada por fake news e manipulada por políticos populistas. O empobrecimento cultural está associado à perda da memória. No filme Yesterday (2019), um rapaz quando acorda de um longo coma e toca as músicas dos Beatles ninguém as reconhece, porque no período houve um apagão de todos os computadores. A terceirização da memória e o empobrecimento da escrita implicam na incapacidade de expressar emoções e formular reflexões complexas e na obstrução da História. Não é por acaso que ditadores queimam e censuram livros.


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