Artigos de Jornal
A revelação de um exímio cronista
Eu não diria que foi uma surpresa, já conhecia algumas de suas crônicas publicadas neste jornal. Lançamento de livros em shoppings centers com filas é um saco. Mas o lançamento do livro Minha Vida de Jasmim e outras crônicas, Ed. Azeviche, do escritor, fotógrafo e marchand Dimitri Ganzelevitch, no último dia 26 de julho, no pequeno anfiteatro de sua casa, no Carmo, debruçada sobre a baía, ao pôr de sol de um sábado, com a dramatização de algumas de suas crônicas pelos atores Marcelo Flores, Rita Rocha e Igor Epifânio, foi um evento lindíssimo, à altura de seu livro.
Dimitri nasceu em Rabat, no Marrocos, descendente de família francesa, por parte de mãe, e de judeus russos, por parte de pai, e adolesceu em Casablanca, Madri, Lisboa, Paris, Londres e viajou por toda Europa, Oriente Médio, África e América Latina para fundear na Bahia em 1975. Essa experiência de vida já dava a ele uma condição especial como escritor. Se juntarmos a isso seu caráter boémio, degustador da culinária, dos vinhos, tequilas e aguardentes locais onde viveu e vagamundeou e sua paixão por descrever essas experiências em seu diário fazem dele um cronista nato. A grande maioria desses textos são inéditos e uns poucos foram publicados em jornais. Por isso sempre insisti que ele deveria perenizar suas melhores crônicas em um livro.
Esse é seu primeiro livro de crônicas, selecionadas por ele próprio e pelo cineasta Bernard Attal, comemorativo de seus 50 anos de Bahia e 89 anos de vida, bem vivida, mas que pode se transformar em muitos outros livros com crônicas garimpadas por terceiros. Minha Vida de Jasmim é em parte um livro auto biográfico e de memórias e em parte do tipo On the road do estadunidense Jack Kerouac. Morando no centro histórico de Salvador, ele domina o linguajar baiano como poucos escritores compondo um caleidoscópio de 75 crônicas ao mesmo tempo poéticas e irônicas de vivências internacionais sofisticadas e do cotidiano baiano.
Sua viagem começa na Lisboa de Amália Rodrigues e segue pela Inglaterra, saltando para a Turquia, Egito, França, Síria, Espanha e América Latina até chegar à Bahia. Essa é a grande pergunta de seus amigos e dele próprio. Carybé e Verger foram capturados por Anísio Teixeira. Ele foi capturado ao ouvir um LP de Dorival Caymmi e se encantar com sua música.
Um tio que trabalhava para a ONU no Rio o convidou, em 1971, para participar do carnaval e com uma amiga veio a Salvador e conheceu Caymmi na casa de Jorge Amado. Quatro anos mais tarde resolveu morar na Bahia. A partir desse ponto o livro é uma sequência de encantamentos com a flora e a fauna local e de episódios hilários vividos por ele na Bahia. Esse estranhamento da cultura local faz dele um revelador de facetas que nós mesmos desconhecíamos, narradas de forma coloquial e leve.